sexta-feira, 2 de maio de 2008

A Análise Sensorial da Cachaça, segundo Maccari

Na palestra que aconteceu na última quarta-feira, 30 de abril, na feira Brasil Cachaça, do professor Agenor Maccari Junior — que coordena diretamente o Laboratório de Tecnologia de Produtos Agrícolas, da Universidade Federal do Paraná, de Curitiba —, aprendemos como fazer uma análise sensorial da cachaça.

A prática de análise sensorial é recente. Ela surgiu na Segunda Guerra Mundial, quando os Estados Unidos mandavam
as “rações” para seus soldados. Estes, comiam a quantidade certa de calorias mas não gostavam do que comiam e cheiravam. Começou-se então a trabalhar para se chegar a um melhor sabor e uma melhor visão do que se comia. A partir de dos anos 1990, começamos a ter literatura a seguir e hoje, há uma norma técnica, apresentada pela ABNT.

A terminologia que surgiu para se explicar os cinco sentidos de comidas e bebidas é uma forma de controle de qualidade dos produtos. Mas, o mercado consumidor ainda não sabe definir as mudanças que esse controle acarretou. Segundo o professor, o consumidor está “desligado” ainda da tecnologia que já existe atualmente.

Um teste analítico é diferente de um teste de preferência. O que fizemos nesta palestra foi um teste de preferência, um teste afetivo — o que nos parece ser melhor, através de nossa bagagem cultural e conhecimento empírico. O teste analítico é um teste de comparação entre produtos, em que fazemos um descritivo das diferenças que sentimos através de um treinamento de memória dos sentidos, de nossa “máquina sensorial”: boca, garganta, nariz e olhos.

Para fazer a análise, institui-se uma taça para fazê-lo. O copo de dose de cachaça (“martelinho”), que estamos acostumados, não nos dá uma possibilidade tão grande para fazer a análise visual, olfativa e mesmo de paladar. Então, vamos por partes:

• Análise visual
70% da escolha de uma cachaça é visual. Se você gosta mais da “branquinha” ou da “amarelinha”, já começa sua escolha por aí.

Devemos seguir os seguintes critérios:

- Limpidez. Analise se tem transparência ou turbidez na cachaça e veja qual agrada mais o seu olhar. (Se a cachaça é turva, demonstra que tem mais água do que o necessário.)

- Oleosidade ou viscosidade
Quando você mexe ou “chacoalha” o vinho dentro do copo, vê uma coroa se formar e as “pernas” do líquido escorrer. Na cachaça, é preciso somente mexer levemente o líquido dentro da taça, porque não é preciso “desprender” tantas características do líquido. Assim, da mesma forma que o vinho, a cachaça também coroa ou cria um colar do líquido, que escorre lentamente pelo vidro.

Quanto maior a graduação alcoólica, maior, mais visível é o rosário ou colar. Se não coroar, é sinal de que a cachaça tem muita água. As lágrimas (ou pernas, terminologia usada para o vinho) são resultado do álcool glicerol. Quanto mais visíveis, mais álcool glicerol — que é um componente que faz a cachaça ser mais doce. Portanto, quanto mais lágrimas, mais álcool glicerol, mais sabor adocicado tem a cachaça.

- Cor e intensidade
É cultural. Quem faz o teste, escolhe o que tem preferência. E pronto.

- Brilho
É o filtro que se usa para a cachaça que vai fazer com que ela tenha mais ou menos brilho.

• Análise Olfativa
É preciso padronizar a distância do nariz em relação ao copo. “Se você vai colocar o nariz dentro do copo, coloque sempre. Se vai colocar a 5cm de distância, coloque sempre na mesma distância”, afirma o professor Maccari. Assim, você tem um padrão para comparar uma bebida em relação a outra, seguindo os mesmos parâmetros.

- Intensidade
Quanto maior a área da “boca” do copo, mais o aroma é disperso. Por isso, é preciso escolher bem em que copo ou taça vai-se fazer o teste e usá-lo sempre para poder comparar. A taça dos cristais Hering foi escolhida para os testes por ter uma curvatura e depois abrir, já sendo considerada a taça ideal para degustação de cachaça.

- Qualidade
Aqui, não se pergunta se é muita ou pouca qualidade. A pergunta é o quanto lhe agrada.

- Franqueza ou limpeza do aroma
Neste item, a questão é a honestidade da cachaça e também gosto pessoal. Se ela “queima”, por exemplo, e isso é assumido, há franqueza no produto. O aroma envolve tanto nariz quanto boca (este é o real flavour, a palavra inglesa que traduz aroma).

- Odores
Estes são o nariz quem sente e afirma ou nega sua qualidade. (Diferente de aroma que envolve a boca também.)

• Análise Gustativa
Há discussões acadêmicas sobre analisar cada “gosto” (doce, azedo, salgado) em separado ou se na verdade, é preciso saber de suas qualidade sentindo um todo. Maccari já segue esse novo conceito em que não se deve separar cada parte mas, explica onde se sente mais o quê.

- Gostos básicos e harmonia (gostos)
Para sentir o doce, coloque a cachaça na ponta da língua;
Para sentir o amargo, coloque a cachaça no fundo da boca;
A acidez se sente nas laterais da língua. É preciso que fique claro que acidez é diferente de quantidade de álcool. A acidez depende de componentes presentes ou não na bebida.

- Sensações bucais
Ardência ou pungência. – Queima?
Adstringência. – Amarra na boca?
Alcoólico. – Sua boca seca? (A mucosa resseca quando há muito álcool)
Equilíbrio. – Isso tudo combina?

• Análise Retro-olfativa
Esta envolve toda a máquina sensorial. Boca, nariz, garganta.
Para esse teste, é preciso tomar uma quantidade de cachaça suficiente para senti-la na boca. Não engula de uma vez. Primeiro deixe a cachaça “passear” por toda a sua boca. Depois, inspire o ar antes de engolir a cachaça e só expire o ar quando já tiver engolido. Assim, vai conseguir sentir o que a cachaça deixa de gosto na sua boca. Quais são os resíduos que você mantém na boca, depois de já haver tomado a bebida:

- Fineza ou qualidade
- Sabores (positivos e negativos)
- Persistência (por quanto tempo o gosto ainda fica em sua boca e se isso é bom).

Atenção: O que se deve sempre ter em mente é que a análise acontece a partir do que agrada à pessoa que está fazendo o teste. Por isso, não há certo e errado em nenhuma dessas observações — depende do seu gosto.

Difícil mesmo é colocar todas essas sensações em palavras. Mas, a palestra do professor Maccari faz com que você veja a cachaça com muito mais requinte e admiração. Temos que aprender a comunicar o que temos de sabores no Brasil!

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